Por Osnilda Lima-SIGNIS Brasil
Em 2008 fui enviada em missão para Amazônia, cidade de Porto Velho, capital de Rondônia, no Brasil. Este foi meu primeiro contato com o povo amazônico.
Lá encontrei uma Igreja “com cheiro de ovelha”, como diz o papa Francisco, uma Igreja encarnada na realidade, com uma ação evangelizadora de libertação. Não à toa a Igreja da Amazônia, tem em sua essência o martírio, muitas lideranças são martirizadas e tantas pessoas ameaçadas de morte, por defender os povos e com os povos as florestas, os rios e as terras frente às situações de morte e ganância que tudo destrói.
Logo após a chegada em Rondônia, realizamos uma missão no distrito de Calama no baixo Rio Madeira. A comunidade é acessada por via fluvial, e está aproximadamente 200 quilômetros da capital Porto Velho, mas leva em torno de 10 horas de barco na ida, ou seja, descendo no sentido da correnteza do rio, na volta, subindo contra a correnteza, pode levar até 18 horas.
De Calama, fomos para a comunidade Terra Firme, 2 horas de voadeira, umas das últimas comunidades do estado rondoniense e que já faz divisa com o estado do Amazonas.
Em Terra Firme, estava a pequena igreja de madeira, de frente para o Rio. Ao avistar a chegada das missionárias o sino foi tocado para reunir a comunidade para a celebração. Quem tocou o sino? Dona Joana, a matriarca da comunidade. Em torno de 10 famílias viviam nessa comunidade e Dona Joana, à época 80 anos, também, exercia o papel da liderança religiosa.
Ela contou que faziam uns dois anos que o padre não passava por lá. Mas a comunidade vive a fé crista católica ao redor da Palavra e da devoção popular, o alimento que fortalece a comunidade. A presença do padre é extremamente esporádica, portanto, não há celebração da missa nessa comunidade e em milhares de outras em toda a Pan-Amazônia. Como responder e essa ausência?
Vale ressaltar que a caminhada da Igreja na região da Amazônia brasileira ganha sua carta de identidade, como afirmava dom Moacyr Grechi [in memorian], a partir do primeiro encontro dos bispos da Amazônia, em 1954, na cidade de Santarém, no estado do Pará, o documento final desse encontro já vislumbrava o que o papa Francisco reforça hoje e deseja com o Sínodo para a Amazônia, a ‘Igreja com rosto amazônico’, fortalecida, reconhecida.
Vale trazer à memoria que o papa Francisco anunciou o Sínodo Especial para a Amazônia no dia 15 de outubro de 2017. E esse processo se iniciou efetivamente com a escuta sinodal, na própria na Pan-Amazônica com sua visita a Puerto Maldonado, Peru, em 19 de janeiro de 2018.
A partir de então iniciou a escuta das comunidades que vivem da Pan-Amazônia. Dessa escuta, das falas dos povos, foi elaborado Instrumentum Laboris que vai ajudar a pautar o Sínodo e favoreceu todo o processo preparatório rumo ao Sínodo.
Sobre o Sínodo para a Amazônia, cujo tema é “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral” e que será realizado de 6 a 27 de outubro de 2019, dom Erwin Krautler, coordenador da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam Brasil), tem explicitado os maiores desafios, a partir da escuta dos territórios, a exemplo da comunidade dona Joana: eis as considerações que o Sínodo precisa considerar: “A valorização de leigas e leigos a serviço (ministério) de suas comunidades sem clericalizá-los; O papel da mulher como evangelizadora não só na família, mas também nas comunidades e vigorosa defensora dos direitos humanos, com acesso ao diaconato; O carisma das ordens e congregações religiosas e sua inserção nas comunidades amazônicas;
A busca de alternativas para enfrentar a ausência da Eucaristia em milhares e milhares de comunidades, quiçá descobrindo ao lado do tradicional um outro modelo de presbítero (não reservado apenas aos homens); O revigoramento das Comunidades Eclesiais de Base como primeiro e fundamental núcleo das dioceses e prelazias; A inculturação dos sacramentos na vida dos povos originários e integração de expressões culturais autóctones na Liturgia; a conscientização e sensibilização de toda a sociedade brasileira em relação à defesa da Amazônia diante da voracidade de empresas que golpeiam e arrasam esse macro-bioma; A implementação da Encíclica Laudato Sì nas comunidades amazônicas; Um incentivo especial à pastoral urbana frente ao inchaço das cidades e o êxodo rural; O escasso uso de meios modernos de comunicação ou a ausência de equipamentos apropriados nas dioceses e prelazias.
Que sejamos corajosos(a), audaciosos(o) ao apelo do papa Francisco, suscitado pelo Espirito Santo, em buscar resposta à Igreja que está na Pan-Amazônia e que poderá iluminar a Igreja do mundo inteiro.
Osnilda Lima: jornalista, secretaria da SIGNIS Brasil e assessora Nacional de Comunicação da Cáritas Brasileira
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